segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Deveremos nós ter o direito de escolher?

Hoje, num dia em que caia muita neve tive uma aula numa unidade de cuidados intensivos de neurocirurgia. Naquela unidade maior parte dos casos têm um prognóstico reservado ou então incerto. Mesmo com toda a mais avançada medicina e tratamento, não se sabe muitas vezes qual será o futuro de muitas das pessoas que entram por aquelas portas. Grande percentagem das pessoas que ocupam as camas desta unidade têm diagnósticos muito graves e grande parte delas não terá mesmo salvação ou ficará dependente de outros para viver...


Mas que vida, será isso viver?


Em busca de um caminho para olhar para isto assisti a um filme intitulado «whose life is it anyway» em que o actor Richard Dreyfuss interpreta o papel de um talentoso escultor e artista que sofre um acidente de carro,depois do qual fica tetraplégico e apenas move a cabeça. Mantém todas as suas faculdades cognitivas e mentais e consegue falar, mas não consegue mexes nenhum outro músculo do pescoço para baixo. Deparado com esta realidade e depois de viver sob cuidado hospitalar permanente decide que não que mais viver assim, pois para ele isto não é viver...


Vi também o vídeo do suicídio assistido de um senhor, Craig Eward a quem foi diagnosticada uma condição neurológica degenerativa que fazia com que progressivamente fosse perdendo todas as suas funções motoras e eventualmente iria falecer devido a ela. Vendo este cenário decidiu recorrer a' única clínica no mundo que poderia, legalmente proceder ao suicídio assistido chamada Dignitas na Suíça.

Agora, será que deverá ou não ser deixado na mão da pessoa que sofre a escolha de poder ou não acabar com a sua própria vida?

Deveria ou não ser possível em certos casos dar-se a opção do suicídio assistido ou eutanásia? Se sim, em que casos sim e em que casos não?


O eterno dilema se levanta.....deixo-vos os links com os vídeos.


Whose life is it anyway : http://www.youtube.com/watch?v=ghaWRNzy1jI


right to die, assisted suicide euthanasia : http://www.youtube.com/watch?v=bxQYTFIZi8A


Da' que pensar!


2 comentários:

  1. Fiquei muito contente por teres visto o filme «whose life is it anyway» como tinha-te referido, é óptimo para o contexto profissional e académico,especialmente de enfermagem e medicina. Ter consciência e reflectir sobre os problemas e dilemas éticos inerentes à hospitalização e prestação de cuidados em saúde é um imperativo para o desenvolvimento de competências. Valores e Princípos éticos como o Principio da beneficiência e nao maleficiência Vs principio da autonomia, dever moral de preservar a vida, dignidade, liberdade fazem parte da prestação de cuidados à Pessoa.por conseguinte, só com a reflexão e partilha de questões subjectivas como sentimentos, emoções, posições existenciais, um profissional de saúde pode atingir a humanização dos cuidados e uma prestação de cuidados de qualidade.

    Esta realidade ganha ,na minha opinião, maior urgência na carreira académica de medicina uma vez que os estudantes pela metodologia do curso e pelas características da própria disciplina que é a medicina, acabam por ser formados segundo uma visão bio-médica, objectivista e com o enfoque apenas ou maioritariamente na doença, descurando a pessoa. O filme relata um dos extremos, o "encarniçamento terapeutico", muito vigente até há poucas décadas e no qual o doente tinha uma autonomia de decisão reduzida, vendo os seus valores,principios e decisoes muitas vezes submissas à visão e vontade de médicos e em menor grau,enfermeiros. como no ex. do filme ou por exemplo o prosseguir de intervenções medicas em casos terminais só com o prolongar do sofrimento do doente como consequência. Nas últimas décadas a medicina humanizou-se mais e este é um dos aspectos em que tem de aprender com a disciplina de enfermagem (tal como se verifica o oposto noutros aspectos). Não querendo descontextualizar o cerne da intervenção em medicina, o tratar, cujo foco é diferente de enfermagem, que é o cuidar (no qual se inclui também o tratar), o médico precisa também de ter noção da importância do humanismo na sua prática. Por isso, ter noção da importância da reflexão na prática clínica e académica que é base do desenvolvimento de tomada de decisão clínica, assim como também sobre ética e deontologia e aspectos filosóficos,psico-socio-culturais são premissas urgentes para um enfermeiro recém licenciado, assim como para um médico recém licenciado, este último que praticamente não aborda nenhuma destas vertentes nas aulas(a título de ex. questões como a eutanásia, o aborto,a recusa pelo doente de receber tratamento em casos emergentes, como transfusões sanguíneas, técnicas de comunicação, o estudo do seu código deontológico, debate de sentimentos, emoções e estratégias efectuadas na prática clínica,etc.). Nem faz muitos estágios com efectivo contacto com o doente, nem faz monografias na licenciatura,não usa artigos de investigação frequentemente nos trabalhos (nem os tem muitos), posteriormente muitos poucos alunos fazem mestrado e,efectivamente, investigação.E quando há, como é normal, é apenas quantitativa e de fenómenos objectivos. Deste modo, ver estes filmes, reflectires, termos conversas e leres livros como os que partilhamos (na qual está presente investigação qualitativa de fenómenos subjectivos de realidades individuais e sócio-culturais com peso enorme na prática de cuidados em saúde)fazem-me feliz porque tu pela tua iniciativa tens uma noção do que é toda esta realidade que a medicina na sua formação continua ainda a não mencionar e queres e gostas de reflectir sobre a mesma. É importante e a base do desenvolvimento de competências pessoais e de trabalho interdisciplinar!

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  2. Ao fazer esta minha crítica à medicina, muita gente pensará no senso comum "médicos e enfermeiros chocam muito", como noutras profissões como físicos e químicos.Isto acontece uma vez que as primeiras duas ciências no seus limites sobrepõem-se em muitos aspectos enquanto na sua génese, no seu cerne, complementam-se. Contudo, como a medicina ainda tende a desviar-se de certos fenómenos humanos e subjacentes à prática clínica (muitos inerentes à própria concepção e filosofia humana, como p. ex. o cuidar, o acto humano mais básico na vida) marginalizados e desvalorizados desde o desenvolvimento do método científico e da medicina moderna, tais atitudes e palavras podem ser estigmatizadas como complexos de quem vê de fora, especialmente quando o Sistema Nacional de Saude no país está ainda muito arquitectado com base na medicina e em valores biomédicos e, consequentemente, com custos para a qualidade de vida da nossa população.

    Beijo grande**

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